ARLA/CLUSTER: Radiotelescópios observam o gigante no nosso "quintal cósmico"
João Costa > CT1FBF
ct1fbf gmail.com
Sexta-Feira, 26 de Abril de 2019 - 10:20:26 WEST
<https://i.imgur.com/Bsw9Xtc.jpg>
O centro da nossa Galáxia, a Via Láctea, só é visÃvel aos radiotelescópios.
O buraco negro supermassivo no seu núcleo brilha no rádio rodeado por anéis
de gás e poeira de remanescentes de supernova e arcos de material apanhados
nos fortes campos magnéticos do núcleo. Esta imagem gigantesca é uma
composição de várias observações obtidas pelo VLA (Very Large Array).
Crédito: NRAO/NAUI/NSF
Recentemente, foram combinados vários observatórios rádio para formar o
GMVA (Global mm-VLBI Array), uma poderosa ferramenta que sondou a região
perto do buraco negro supermassivo da nossa Galáxia. Foram produzidas
imagens curiosas desta região, brilhando intensamente no rádio. Estas
observações, que envolveram três radiotelescópios norte-americanos - VLA,
VLBA e GBT - são um passo importante para a observação do horizonte de
eventos de um buraco negro. Aqui fica a história desta investigação até
agora.
Há um gigante no nosso "quintal cósmico". Sabemos que lá está, mas nunca
ninguém o viu. É um buraco negro supermassivo e esconde-se no centro da
nossa Galáxia.
Em 1931, o engenheiro Karl Jansky observou pela primeira vez um forte sinal
cósmico de rádio proveniente da constelação de Sagitário, que se encontra
na direção do centro da nossa Galáxia. Jansky assumiu que os sinais de
rádio eram originários do centro da nossa Galáxia, mas não fazia ideia do
que essa fonte podia ser e o seu telescópio era incapaz de identificar a
localização exata. Isso sucedeu em 1974, quando Bruce Balick e Robert Brown
usaram três antenas rádio do Observatório Green Bank e uma quarta antena
mais pequena a cerca de 35 km de distância para formar um radiotelescópio
muito mais preciso chamado interferómetro.
Interferometria é um método de usar vários radiotelescópios ou antenas como
um único telescópio virtual. Quando duas antenas estão apontadas para o
mesmo objeto no céu, recebem o mesmo sinal, mas os sinais estão em
dessintonia porque um demora um pouco mais a alcançar uma antena do que a
outra. A diferença de tempo depende da direção das antenas e da distância
entre elas. Ao correlacionar os dois sinais, podemos determinar a
localização da fonte com muita precisão. Com o GBI (Green Bank
Interferometer), Balick e Brown confirmaram a fonte rádio como uma região
muito pequena perto do Centro Galáctico. Brown mais tarde denominou a fonte
Sagitário A*, ou Sgr A* para abreviar.
<https://www.mpifr-bonn.mpg.de/4408863/original-1548058958.jpg?t=eyJ3aWR0aCI6ODAwLCJoZWlnaHQiOjYwMCwib2JqX2lkIjo0NDA4ODYzfQ==--c86e6b9cd92c27a6942e8effd0cafc28ccdc263a>
Esquerda, topo: simulação de Sgr A* a 86 GHz. Direita, topo: simuação, com
efeitos adicionados de dispersão. Direita, baixo: imagem dispersada das
observações, é assim que vemos Sgr A* no céu. Esquerda, baixo: a imagem não
dispersada, depois de removidos os efeitos de dispersão, ao longo da nossa
linha de visão, o aspeto "real" de Sgr A*.
Crédito: S. Issaoun, M. Mościbrodzka, Universidade Radboud/M. D. Johnson,
CfA
O GBI foi um antecessor do VLA (Very Large Array) do NRAO (National Radio
Astronomy Observatory). O VLA é composto por 28 antenas capazes de
configurações amplamente separadas e juntas, tornando-se a ferramenta
perfeita para estudar Sgr A*. Em 1983, uma equipa liderada por Ron Ekers
usou o VLA para fazer a primeira imagem rádio do Centro Galáctico, que
revelou uma mini-espiral de gás quente. Observações posteriores mostraram
não apenas a espiral de gás, mas também uma fonte de rádio distinta e
brilhante no centro exato da Via Láctea.
Nesta altura suspeitava-se fortemente que esta fonte de rádio fosse um
enorme buraco negro. Entre 1982 e 1998, Don Backer e Dick Stramek, no VLA,
mediram a posição de Sgr A* e descobriram que quase não havia movimento
aparente. Isto significava que devia ser extremamente massivo, já que os
puxões gravitacionais de estrelas próximas não o faziam mover-se. Eles
estimaram que devia ter uma massa equivalente a pelo menos dois milhões de
sóis. Observações a longo prazo das estrelas em órbita do Centro Galáctico
descobriram que Sgr A* tem aproximadamente 3,6 milhões de massas solares, e
imagens rádio detalhadas confirmaram que não deve ser maior que a órbita de
Mercúrio em torno do Sol. Sabemos agora que é, de facto, um buraco negro
supermassivo.
Estar ciente da existência de um buraco negro não é o mesmo que o ver
diretamente. Os astrónomos há muito que sonham em observar diretamente um
buraco negro e talvez até vislumbrar o seu horizonte de eventos. Sagitário
A* é o buraco negro supermassivo mais próximo da Terra, de modo que têm
havido vários esforços para o observar diretamente. Mas há dois grandes
desafios a serem superados. O primeiro é que o centro da nossa Via Láctea
está rodeado por gás e poeira densos. Quase toda a luz visÃvel da região é
obscurecida, por isso não podemos observar o buraco negro com um telescópio
ótico. Felizmente, o gás e a poeira são relativamente transparentes ao
rádio, o que significa que os radiotelescópios podem ver o coração da nossa
Galáxia. Mas isto leva ao segundo grande desafio: a resolução.
Embora o buraco negro Sgr A* seja massivo, tem apenas o tamanho de uma
estrela grande. Segundo a teoria da relatividade geral de Einstein, um
buraco negro com 3,6 milhões de vezes a massa do Sol teria um horizonte de
eventos apenas 15 vezes maior que a nossa estrela. Tendo em conta que o
Centro Galáctico está a aproximadamente 26.000 anos-luz da Terra, o buraco
negro tem um tamanho aparente muito pequeno no céu, mais ou menos
equivalente a ver uma bola de basebol à superfÃcie da Lua. Para ver um
objeto rádio tão pequeno, precisamos de um telescópio do tamanho da própria
Terra.
<https://i.imgur.com/iJbIZsz.jpg>
Esta imagem mostra as localizações do telescópios que participam no EHT
(Event Horizon Telescope) e no GMVA (Global mm-VLBI Array). O seu objetivo
é obter, pela primeira vez, uma imagem da sombra do horizonte de eventos do
buraco negro supermassivo no centro da Via Láctea, bem como estudar as
propriedades da acreção e do fluxo em redor do Centro Galáctico.
Crédito: ESO/O. Furtak
Obviamente, não podemos construir um radiotelescópio do tamanho do nosso
planeta, mas com a interferometria rádio podemos construir um telescópio
virtual do tamanho da Terra. Os observatórios do NRAO estão atualmente a
trabalhar em dois projetos que tentam observar um buraco negro, o EHT
(Event Horizon Telescope) e o GMVA (Global mm-VLBI Array). O ALMA (Atacama
Large Millimeter/submillimeter Array) está a participar em ambos os
projetos, enquanto o GBT (Green Bank Telescope) e o VLBA (Very Long
Baseline Array) fazem parte do GMVA. Tal como o VLA, estes projetos
combinam sinais de múltiplas antenas. Dado que as antenas estão localizadas
por todo o mundo, este telescópio virtual tem mais ou menos o tamanho da
Terra. Mas, ao contrário das antenas do VLA, todas elas têm diferentes
tamanhos e sensibilidades. Esta diversidade de antenas dificulta a
combinação dos sinais, mas também fornece uma grande vantagem aos projetos.
No VLA, por exemplo, todas as antenas da rede são idênticas. Cada antena
contribui igualmente e a sensibilidade do complexo depende do tamanho de
uma única antena. Mas quando telescópios, ou antenas de diferentes
tamanhos, são combinados, a sensibilidade das antenas maiores ajuda a
aumentar a sensibilidade das menores. O GBT, por exemplo, tem um diâmetro
de 100 metros. Quando combinado com telescópios mais pequenos num grande
interferómetro, a sensibilidade total depende do tamanho médio de todas as
antenas. Isso torna o ALMA - ligado ao EHT e ao GMVA - e o GBT - ligado ao
GMVA - muito mais sensÃvel aos sinais do buraco negro da Via Láctea, e os
cientistas precisam de toda a sensibilidade possÃvel para capturar a imagem
de um buraco negro.
Em janeiro de 2019, o GMVA capturou uma imagem de Sagitário A* a
comprimentos de onda de 3mm, mas a dispersão de luz a 3mm pelo plasma
situado entre nós e Sgr A* tornou impossÃvel ver a sombra do seu horizonte
de eventos. A primeira imagem nÃtida de um buraco negro foi anunciada pelo
EHT em abril de 2019. Era uma imagem do buraco negro da galáxia M87. Embora
M87 esteja mais de 2000 vezes mais distante que o buraco negro no centro da
nossa Galáxia, o seu buraco negro central é também 1500 vezes mais massivo.
É um buraco negro muito ativo e não está obscurecido pelo gás e poeira da
nossa Galáxia, facilitando a observação. A observação do nosso buraco
negro, mais pequeno e calmo, é um desafio maior. Mas ao trabalharem com
observatórios espalhados por todo o mundo, o ALMA e o GBT terão em breve a
primeira imagem nÃtida do gigante situado no nosso "quintal cósmico".
// NRAO (comunicado de imprensa)
<https://public.nrao.edu/news/2019-the-giant-in-our-backyard>
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*Saiba mais*
*CCVAlg - Astronomia:*
12/04/2019 - Astrónomos obtêm primeira imagem de um buraco negro
<http://www.ccvalg.pt/astronomia/noticias/2019/04/12_eht_buraco_negro_m87.htm>
25/01/2019 - Levantando o véu do buraco negro no coração da nossa Galáxia
<http://www.ccvalg.pt/astronomia/noticias/2019/01/25_sgr_a.htm>
16/10/2018 - Qual é o aspeto de um buraco negro?
<http://www.ccvalg.pt/astronomia/noticias/2018/10/16_sgr_a_eht.htm>
31/03/2017 - Os astrónomos vão tentar fotografar a região mais próxima do
buraco negro da Via Láctea
<http://www.ccvalg.pt/astronomia/noticias/2017/03/31_event_horizon_telescope.htm>
*Sagitário A*:*Wikipedia <http://en.wikipedia.org/wiki/Sagittarius_A*>
*Buraco negro supermassivo de M87:*
Wikipedia <https://en.wikipedia.org/wiki/Messier_87#Supermassive_black_hole>
*Buraco negro supermassivo:*
Wikipedia <http://en.wikipedia.org/wiki/Supermassive_black_hole>
*Interferometria astronómica:*
Wikipedia <https://en.wikipedia.org/wiki/Astronomical_interferometer>
*GMVA:*
Página oficial <https://www3.mpifr-bonn.mpg.de/div/vlbi/globalmm/>
*EHT (Event Horizon Telescope):*
Página oficial <http://www.eventhorizontelescope.org/>
Wikipedia <https://en.wikipedia.org/wiki/Event_Horizon_Telescope>
*VLA:*
Página oficial <http://www.vla.nrao.edu/>
NRAO <https://public.nrao.edu/>
Wikipedia <http://en.wikipedia.org/wiki/Very_Large_Array>
*VLBA:*
NRAO <https://science.nrao.edu/facilities/vlba>
Wikipedia <http://en.wikipedia.org/wiki/Very_Long_Baseline_Array>
*GBT (Telescópio Robert C. Byrd Green Bank):*
Página oficial <http://greenbankobservatory.org/>
Wikipedia <http://en.wikipedia.org/wiki/Green_Bank_Telescope>
*ALMA:*
Página oficial <http://www.almaobservatory.org/>
ALMA (NRAO) <http://www.nrao.edu/index.php/about/facilities/alma>
ALMA (NAOJ) <http://alma.mtk.nao.ac.jp/e/>
ALMA (ESO) <http://www.eso.org/public/teles-instr/alma.html>
Wikipedia <http://en.wikipedia.org/wiki/Atacama_Large_Millimeter_Array>
*GBI:*
Wikipedia <https://en.wikipedia.org/wiki/Green_Bank_Interferometer>
Fonte: Centro Ciência Viva do Algarve | Centro Ciência Viva de Tavira
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