Re: ARLA/CLUSTER: Petição Pela liberdade de investigação académica

AV radiophilo gmail.com
Quinta-Feira, 8 de Novembro de 2012 - 03:37:13 WET


Caro Luis Filipe,

Lamento que a minha mensagem telegráfica possa não ter sido eficaz a
transmitir o que penso sobre o assunto. Vou tentar clarificá-lo,
respondendo  o melhor possível às suas perguntas.

Começo por dizer que não vejo o mundo a preto e branco com bons de um lado
e maus do outro.

1. Em relação às virtudes e qualidades da TDT em Portugal, sou da opinião
de que o avanço técnico foi diminuto para o investimento que todos fizemos.
A existência de falhas técnicas e intermitências, já aqui muito discutidas
e que ocorreram sobretudo na época de verão, é difícil de compreender e de
aceitar.
O problema da cobertura ou da ausência dela é igualmente dificil de
aceitar, ou talvez mais ainda, por muitas contas e estatísticas que se
apresentem.

Pessoalmente sinto-me enganado porque fui conduzido a gastar meia centena
de euros para ter funcionalidades marginais que não iria comprar por minha
iniciativa (não sou grande consumidor de TV), não tirando daí benefícios de
maior.

Em relação aos 4 canais, e descontando o tal canal HD que foi prometido e
depois roubado, não entendo as comparações que se fazem com outros países.
Daquilo que conheço da TDT em alguns deles, esta foi aproveitada para
distribuir canais que já existiam, isto é, nesses países já havia muita
produção que passou a beneficiar do novo suporte.

2. Aproveito para abordar o SIRESP e a liberdade de imprensa ao mesmo
tempo. O colega talvez se recorde de um artigo publicado há alguns anos
atrás por uma "jornalista" de um jornal de grande difusão denegrindo os
radioamadores de forma particularmente contundente. Estou convencido que o
objectivo contratado dessa notícia foi exclusivamente promover e acelerar a
implementação do SIRESP, sem olhar a meios.

Julgo que com o poder e com a liberdade vem a responsabilidade.
Acredito profundamente que a liberdade de imprensa é uma conquista muito
valiosa da nossa sociedade moderna, mas tenho ressentimento contra a classe
que, paradoxalmente, mais esbanja essa riqueza.

3. De forma geral esse tipo de abusos de poder são protegidos pelo
corporativismo, que se manifesta em muitíssimas áreas da nossa sociedade,
desde organizações e ordens profissionais até organizações políticas, já
para não falar de interesses e poderes mais obscuros.
Observo que as iniciativas públicas dessas corporações procuram capitalizar
as emoções e mitos correntes na sociedade, o banal senso comum, a correcção
política e a plausibilidade para dinamizar os movimentos que mais lhes
interessam.

Todos estes sinais estão presentes na "petição dos coitadinhos" cujos
interesses receio bem estarem muito para além da defesa da "liberdade de
investigação científica".
Quanto à encomenda do estudo, é claro que não me referia a este, que
acredito ter feito de boa fé e que tudo indica ser credível, mas sim a
outros de que por aí se fala. Não sei o que afectará mais a "independência
da investigação científica", se uma ameaça de acção em tribunal, ou se a
encomenda de um estudo académico sobre os malefícios dos telefones
celulares por um fabricante deste tipo de equipamentos.
A relação entre a academia e a indústria é muitas vezes simbiótica, não o
esqueçamos, para o bem e para o mal.

4. Não tenho nenhuma relação particular com a PT, nem pessoal nem de
natureza alguma.
Sei que algum do dinheiro que pago ao estado todos os meses lá irá parar,
nada mais. Nem sequer sou cliente deles.
De resto isso pouco importa. Tive a ocasião de aqui escrever recentemente
que achava a sua acção judicial como reveladora da sua culpa na qual passei
a acreditar. De igual forma encaro esta acção da academia como reveladora
da sua falta de inocência. Não me refiro a este cientista em particular,
note-se.

5. Quero ainda acrescentar algumas palavras que podem ajudar a esclarecer a
minha apreciação da tal "petição dos pobrezinhos".
Esta quadrilha de justiceiros pretende nada menos que levar a Comissão de
Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e  Garantias da Assembleia
da República a  louvar e reconhecer como VERDADE as conclusões do cientista!
Querem também levar a esses e mais aos outros a reclamar e reconhecer
privilégios especiais para a classe.

Pelo meio ainda reclamam que os cientistas apenas podem ser avaliados por
critérios científicos, embora eu duvide que a acção da PT seja no sentido
de rever em baixa a nota final do académico.

Ah, e quase me esquecia do mais importante. Parece que também querem
convencer o povo, capitalizando em mitos, descontentamentos correntes na
sociedade, banalidades e correcção política, que a sua argumentação
constitui prova suficiente da culpa dos maus, dispensando assim o
julgamento dos tribunais, dos quais reclamam imunidade justamente para não
se sentirem amordaçados.

Tenham paciência! Já demos muito para esse peditório. Afinal exactamente
quem e como ameaça a liberdade de investigação académica, ao ponto de
justificar esta petição?
E o que justifica tal pedido de imunidade? Se o investigador nada fez
contra a lei, então nada tem que temer dos tribunais.

Finalmente quero agradecer as suas amáveis palavras. Sei que não mereço tal
distinção, mas fico satisfeito que o colega tenha encontrado algo de
interesse entre o que por aqui vou escrevendo.

73,
António Vilela
CT1JHQ


2012/11/7 Luís Garcia Filipe <afterhours36  gmail.com>

>
> Boa noite.
>
> Senhor António Vilela, encontra vossa excelência explicação racional para
> o aumento grotesco dos Clientes, Zon, etc, depois do sinal analógico ter
> sido desligado?
>
> Tendo analisado que o Senhor António Vilela, pela maioria dos seus
> comentários, é uma pessoa de elevado conhecimento técnico sobre
> rádio-frequência, consegue explicar a grosseira ineficiência da cobertura
> da TDT?
>
> Concorda que o gasto que se fez em equipamento para a TDT, foi de um
> esbanjar semelhante ao da implementação da rede Ciresp (que acabou por ser
> alvo de investigação?), para termos os mesmos 4 canais? (quem consegue ter)
>
> Acredita mesmo que o trabalho cientifico foi encomendado? Por quem?
>
> Acredita que a liberdade de expressão / Imprensa, é um mal que aflige
> Portugal? Porquê?
>
> Qual é a sua relação com a Portugal Telecom? Tem alguma?
>
> Entenda vossa excelência, que não estou a interrogá-lo, mas sim gostaria
> de saber a sua opinião quanto ás questões que levanto, na leitura da sua
> opinião sobre a petição, uma vez que considero, pelas leituras que faço das
> suas opiniões, uma grande figura do rádio-amadorismo em Portugal (entre
> muito poucos), cuja opinião de critica técnica tem sido de alguma
> influência para mim, apesar de não o conhecer pessoalmente.
>
> 73, CR7AEL
>
>
>
>
>
> No dia 7 de Novembro de 2012 20:21, AV <radiophilo  gmail.com> escreveu:
>
> Não vou assinar.
>> Não há uma virgula que esteja bem nesta petição, arre!
>>
>> - Esta petição é um atestado de menoridade aos tribunais, sugerindo que
>> possam estar ao serviço dos "interesses".
>> - Já chegam os atropelos que se fazem à sombra da chamada "liberdade de
>> imprensa", o que mais cá faltava agora era imunidade judicial para os
>> investigadores académicos.
>> - Estranha-se esta posição, quando se apercebem bem mais indícios de
>> trabalhos científicos com conclusões encomendadas pelos "interesses" do que
>> o condicionamento pela negativa.
>> - Os investigadores científicos devem, como qualquer outro profissional,
>> ser pessoas responsáveis pelo seu trabalho e assim estar sujeitos ao
>> escrutínio público.
>> - Quem não deve não teme. Eles que movam as acções judiciais que
>> entendam. A verdade virá ao de cima, se é que não está já a emergir...
>>
>> 73,
>> António Vilela
>> CT1JHQ
>>
>>
>>
>> 2012/11/7 João Costa > CT1FBF <ct1fbf  gmail.com>
>>
>>>  Para:Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e
>>> Garantias da Assembleia da República; Presidente do Conselho de
>>> Reitores das Universidades Portuguesas; Presidente do Conselho
>>> Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos
>>>
>>> Uma tese de doutoramento apresentada recentemente por Sérgio Denicoli
>>> e aprovada por unanimidade na Universidade do Minho tornou-se motivo
>>> de notícia nos media e tem desencadeado posições, algumas das quais
>>> suscitam viva inquietação aos subscritores deste texto.
>>>
>>> A investigação realizada centrou-se no modo como foi desenhada e
>>> implementada a televisão digital terrestre (TDT) em Portugal, desde
>>> 2007. O investigador recorreu, entre outros contributos, à “teoria da
>>> captura”, formulada por Stigler (1971) e desenvolvida por Bohem (2007)
>>> no quadro da qual concluiu que, no caso português, o comportamento da
>>> Portugal Telecom (PT) e da Autoridade Nacional de Comunicações
>>> (ANACOM) neste processo configura uma “captura regulatória” da
>>> primeira das entidades sobre a segunda, uma prática que a organização
>>> Transparency International considera ser "acto de corrupção". A
>>> investigação também demonstra que a gestão deste processo de
>>> implementação da TDT ocorreu a par de um aumento substancial das
>>> subscrições de serviços de televisão pagos.
>>>
>>> As notícias sobre este assunto publicadas em vários órgãos de
>>> comunicação social levaram quer a PT quer a ANACOM a anunciar a
>>> intenção de proceder criminalmente contra Sérgio Denicoli, por
>>> considerarem aquelas conclusões da tese injuriosas e difamatórias.
>>>
>>> Sobre esta matéria, os abaixo-assinados entendem ser seu dever afirmar
>>> que seria da maior gravidade que os académicos fossem condicionados ou
>>> amordaçados na sua liberdade de investigação, como se tivessem de ser
>>> avaliados por critérios outros que não os científicos.
>>>
>>> Assim sendo, apelam a todos os cidadãos sintonizados com os valores da
>>> liberdade e da independência da investigação, a todos os membros da
>>> Academia, à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades
>>> e Garantias da Assembleia da República, ao Presidente do Conselho de
>>> Reitores das Universidades Portuguesas e ao Presidente do Conselho
>>> Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos que se mobilizem
>>> para:
>>>
>>> - Manifestar apoio ao Doutor Sérgio Denicoli pelo trabalho
>>> desenvolvido, pela pertinência e oportunidade do estudo levado a cabo
>>> e pelos resultados obtidos nas suas provas de doutoramento;
>>>
>>> - Afirmar perante a sociedade e os diferentes poderes – político,
>>> económico ou outro - que a liberdade académica é um requisito
>>> essencial da actividade científica e que devem ser vigorosamente
>>> combatidas as tentativas de a pôr em causa;
>>>
>>> - Chamar a atenção para a relevância social das investigações que se
>>> propõem contribuir para iluminar os problemas e situações com que se
>>> debatem as sociedades em que vivemos;
>>>
>>> - Exigir das autoridades académicas que facultem enquadramento e
>>> suporte, nomeadamente jurídico, aos seus investigadores, em especial
>>> àqueles que lidam com matérias melindrosas e de impacto público;
>>>
>>> - Denunciar publicamente toda e qualquer tentativa que pretenda
>>> condicionar a investigação científica e atemorizar ou silenciar os
>>> investigadores.
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