Re: ARLA/CLUSTER: Morreu Rafael Correia, o algarvio que foi o criador e a voz do mítico programa “Lugar ao Sul”, da Antena 1.

João Costa > CT1FBF ct1fbf gmail.com
Sexta-Feira, 6 de Março de 2020 - 19:13:32 WET


Vejam bem a importância deste invulgar homem, que foi o Rafael
Correia, aqui dada pelo Álvaro José Ferreira no seu blog " A Nossa
Rádio..."  no dia 10 de Julho de 2009 e com a qual concordo
inteiramente: https://nossaradio.blogspot.com/search?q=Rafael+Correia

João Costa (CT1FBF)

João Costa > CT1FBF <ct1fbf  gmail.com> escreveu no dia sexta,
6/03/2020 à(s) 18:51:
>
> Tive o enorme prazer de chegar a conhecer pessoalmente e por duas
> vezes, o Rafael Correia, aquando da realização das suas reportagens, e
> que foi cognominado por alguns como "o eremita da rádio", só ele e o
> seu gravador, que para mim foi a par com o trabalho do Michel
> Giacometti, quem deu a conhecer através da RDP a verdadeira alma da
> Música Regional Portuguesa.
>
> Subscrevo inteiramente a afirmação do Adelino Gomes, que considerou o
> “Lugar ao Sul” «o mais belo programa da rádio jamais feito sobre a
> terra, as gentes, os costumes, a cultura do Sul do continente
> português».
>
> Sim, o Rafael Correia merecia em vida uma condecoração no dia 10 de
> Junho do Presidente Marcelo pelo seu magnifico trabalho.
>
> Amanhã e Domingo, a partir das 21:00 a Antena 1, retransmite alguns
> dos programas “Lugar ao Sul” numa sentida homenagem a este grande
> senhor da radio. Leiam, mais abaixo, um olhar da Fernanda Câncio sobre
> o Rafael Correia, que quanto a mim descreve muito bem o homem que
> conheci durante algumas horas.
>
> Aqui, na RTP Play em:
> https://www.rtp.pt/play/p650/lugar-ao-sul-reedicao tem disponíveis 93
> episódios do programa Lugar Ao Sul (Reedição), muito embora tivesse a
> ideia que o seu acervo pessoal seria muitissimo maior.
>
> João Costa (CT1FBF)
>
> **********************************************************************************************************
>
> Rafael Correia, morreu esta sexta-feira, 6 de Março, aos 82 anos, em
> Faro, vítima de doença prolongada.
>
> Reformado desde 2008, Rafael Correia fez, durante longas décadas, o
> programa “Lugar ao Sul”, um espaço de recolha – e divulgação – da
> cultura popular, não só do Algarve, como do Alentejo. Nele cabiam as
> tradições, as músicas e as gentes: no fundo, aquilo que conferia
> identidade a um território.
>
> Numa crónica publicada no Diário de Notícias, aquando do fim do
> programa, em 2008, a jornalista Fernanda Câncio deu a conhecer a
> maneira peculiar de trabalhar de Rafael Correia:
>
> «Passou décadas a percorrer o país à procura de pessoas, vozes,
> histórias, canções, usos e ofícios. A maior parte das vezes só, só ele
> e o seu gravador, só ele e o equipamento de som. Fez da solidão uma
> espécie de missão, talvez mesmo de fé. Dizem os colegas e os que o
> chefiaram que também no estúdio, a montar o programa, se fechava
> horas, só ele e o seu material».
>
> Para o histórico jornalista Adelino Gomes, o “Lugar ao Sul” foi mesmo
> «o mais belo programa da rádio jamais feito sobre a terra, as gentes,
> os costumes, a cultura do Sul do continente português».
>
> Mesmo já tendo terminado há mais de 10 anos, numa suspensão polémica,
> este programa continua na memória de muitos ouvintes.
>
> Disso mesmo deu conta João Paulo Guerra, hoje, aos microfones da
> Antena1. «Ainda hoje há ouvintes a escreverem para o provedor do
> ouvinte, a perguntar quando regressa o “Lugar ao Sul” e o Rafael
> Correia», disse o provedor do ouvinte.
>
> Entre os muitos prémios que recebeu ao longo da sua vida, Rafael
> Correia, natural de Santa Bárbara de Nexe (Faro), foi agraciado, em
> 1994, com Prémio de Comunicação Social da Região de Turismo do
> Algarve.
>
> As cerimónias fúnebres decorrem este domingo, 8 de Março, na Igreja de
> São Luís, em Faro.
>
> Fonte: Pedro Lemos in Sul Informação
>
> ************************************************************************************************************
>
> Um olhar de Fernanda Câncio sobre o Rafael Correia.
>
> «Durante quase 30 anos, fez na RDP o programa "Lugar ao Sul". Ganhou
> uma legião de fiéis e um lugar único na história da rádio portuguesa,
> que chegou este Verão (setembro de 2009) ao fim.
>
> Retrato difícil de um homem secreto com um talento precioso, o de
> ouvir e fazer falar. E o de perder tempo.
>
> Passou décadas a percorrer o país à procura de pessoas, vozes,
> histórias, canções, usos e ofícios. A maior parte das vezes só, só ele
> e o seu gravador, só ele e o equipamento de som. Fez da solidão uma
> espécie de missão, talvez mesmo de fé.
>
> Dizem os colegas e os que o chefiaram que também no estúdio, a montar
> o programa, se fechava horas, só ele e o seu material, "numa espécie
> de missa".
>
> Fazia tudo sozinho, desde conduzir o carro ao resto. Era um trabalho
> de paixão, chegou a meter dinheiro dele para fazer aquilo. Noel
> Cardoso, chefe de produção da RDP Sul, não se poupa no retrato.
>
> Tinha uma aptidão extraordinária para descobrir assuntos e pessoas. E
> era incrível a pôr gente a falar, mesmo a mais rural e fechada. Tinha
> essa habilidade. Nunca queria falar com os ‘conhecidos’, perdia muito
> tempo a procurar. Era o ‘Portugal profundo’ – a gente do artesanato,
> das lendas, das canções de trabalho... E fazia três horas de gravação
> para aproveitar vinte minutos.
>
> A ideia do "Lugar ao Sul" ter-lhe-ia surgido, diz Noel Cardoso, depois
> de uma estada em França, a partir de algo de semelhante que lá ouviu.
> Verdade é que programas parecidos chegaram a existir em Portugal,
> antes e durante, mas ninguém contesta a superioridade do de Rafael.
>
> Ganhou quase tudo o que havia para ganhar em rádio, em termos de
> prémios e galardões, garante o director de produção da RDP.
>
> Apesar de tantas distinções, recusava quase sempre entrevistas. Fotos,
> impossível: o mais que se encontra é uma coisa tipo passe, de há muito
> tempo. O telefone de casa toca, sem ninguém atender; de telemóvel
> ninguém lhe ouviu falar. A vida fora da rádio e do programa é um
> mistério: autodidacta como sétimo ano "antigo" (actual 11.°); uma
> mulher e uma filha, talvez; uma casa em Faro; a passagem por um banco
> e por explicações de inglês, a entrada na Emissora Nacional como
> jornalista, a passagem a realizador, a ida para França, alguns dizem
> que "por causa de uma paixão", o regresso e o início, há 29 anos, do
> "Lugar ao Sul".
>
> Ele não fala com ninguém, o problema é esse, lamenta Noel Cardoso. E
> não fala do programa dele: ‘Quem quiser falar do programa oiça e fale,
> eu não falo’.
>
> O programa, de duas horas, era semanal, ao sábado. Ouvintes
> referiam-se, em cartas para a RDP, ao autor como "parte da família" e
> quando o "Lugar ao Sul" passou, recentemente, para metade do tempo
> choveram protestos e temores, o de que fosse a antecâmara do fim. Um
> temor de que o próprio, adianta João Coelho, director da Antena 1 da
> RDP, de 1996 a 2002, padecia. Passava a vida a achar que lhe iam
> acabar com o programa. De cada vez que eu pedia para falar com ele,
> vinha convencido que era dessa. É preciso perceber que quando o
> conheci, nos anos 80, era o tempo da rádio do ‘disc jockey’ e ele era
> tudo ao contrário disso: levava muito tempo a fazer as coisas, e
> fazia-as de uma certa maneira. Sofria muito com a mediania dos quadros
> intermédios, o que terá criado nele um bocado o sentido da
> perseguição.
>
> Que terá nascido primeiro, o isolamento ou a solidão? Que terá feito
> de Rafael Correia o "bicho-do-mato", na expressão de João Coelho, que
> tantos sublinham? Aquilo que lhe posso dizer do Rafael Correia é que é
> uma pessoa muito tímida, muito introvertida, muito individualista. Mas
> conseguia-se sempre colocar no patamar sintáctico, cultural, dos seus
> interlocutores, fossem quem fossem. Tem um talento muito invulgar. E
> recolheu um mosaico interessantíssimo do País, diz José Manuel Nunes,
> director da RDP, de 1984 a 1991, e presidente do respectivo Conselho
> de Administração, de 1995 a 2002.
>
> Um colega da RDP de Faro prossegue o desenho: É uma pessoa de poucas
> falas, muito fechada, de feitio um pouco difícil. Recusava até os
> contactos dos ouvintes e das pessoas que entrevistara. Elas ligavam
> para a RDP e ele não as atendia.
>
> Confere com o testemunho de Álvaro José Ferreira, um dos maiores
> admiradores do programa "Lugar ao Sul" e do seu autor. Quando o e-mail
> dele da RDP estava activo, o que sucedeu até Junho passado, cheguei a
> enviar-lhe várias mensagens, quer para pedir informações sobre temas
> musicais que passava no programa quer para lhe sugerir pessoas a
> visitar, mas nunca tive a sorte de obter uma resposta, apesar de saber
> que teve em consideração algumas das sugestões que lhe fiz.
>
> Criador de um "grupo de amigos do LUGAR AO SUL" no MySpace
> (http://www.myspace.com/lugaraosul) e detentor de um blogue sobre
> rádio (http://nossaradio.blogspot.com/), Álvaro Ferreira reproduziu
> neste último uma longa exortação a várias entidades (a começar pelo
> Presidente da República e a acabar no Provedor do Ouvinte da RDP) na
> qual, com o título "Lugar ao Sul": um programa-património, enumera não
> só as qualidades do mesmo e os prémios e distinções de que foi alvo
> como cita vários elogios de académicos e ouvintes para, finalmente,
> secundar Adelino Gomes, actual Provedor da RDP, no repto à
> administração da RDP para a edição discográfica "do melhor desse
> inestimável acervo", sugerindo também a colocação on-line do espólio
> do programa. Mas não fica por aqui: propõe a realização de uma
> homenagem nacional a Rafael Correia, "talvez no Coliseu dos Recreios".
>
> João Coelho pega na ideia. Fazia-me sentido que ele recebesse uma
> condecoração no 10 de Junho. Se alguém merece, é ele." À falta, claro,
> do que fazia sentido a toda a gente que não passava sem o "Lugar ao
> Sul" — que continuasse.
>
> Aos 72 anos, porém, após a reforma obrigatória e já com contratos a
> termo certo (um expediente que a RDP utiliza para manter ao serviço
> aqueles que assim o desejam) Rafael Correia terá desistido. A
> explicação que mais colhe é a de ter sido convocado para uma nova
> formação tecnológica - é a justificação que Feliciano Estêvão, o
> director da RDP Sul, adianta.
>
> Ele não gostava nada de ter de lidar com novos equipamentos, resistia
> sempre muito, lembra José Manuel Nunes. João Coelho encolhe os ombros:
> Às vezes isso é não saber lidar com as pessoas. Não que eu defenda um
> registo de excepção, mas... Enfim, presumo que ele tenha resolvido
> fazer um real manguito.
>
> Fernanda Câncio, in "Diário de Notícias", 26.09.2009
>
> **************************************************************************************************************************************
>
> Segundo o blog, " A Defesa de Faro": De acordo com informações
> facultadas por fontes internas da própria RDP (insuspeitas), Rafael
> Correia foi empurrado para a reforma, contra sua vontade, sendo que a
> sua alegada "desistência" em meados de 2009 se prendeu, entre outras
> desconsiderações, com o abstruso vínculo contratual que lhe foi
> proposto como condição ‘sine qua non’ para a continuação do programa.
>
> ______________________________________________________________
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> do seu autor e não representa nem vincula a posição
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