ARLA/CLUSTER: Fenda do icebergue gigante da Antárctida dividiu-se em duas, com cinco mil quilómetros quadrados, vai soltar-se da plataforma. E depois?

João Costa > CT1FBF ct1fbf gmail.com
Quinta-Feira, 4 de Maio de 2017 - 11:18:43 WEST


A fissura num grande bloco de gelo, na plataforma Larsen C, partiu-se
em duas, assumindo a forma de uma língua de cobra.

A separação do icebergue está para muito breve, avisam os vigilantes cientistas.

Há vários meses que o bloco de gelo é notícia, relatando-se cada
avanço da fissura na plataforma Larsen C. Actualmente, existem 180
quilómetros de uma fenda aberta no gelo da Antárctida que foi
crescendo a um ritmo impressionante nos últimos meses. O final é mais
ou menos previsível: um icebergue gigante, com cinco mil quilómetros
quadrados, vai soltar-se da plataforma. E depois?

Está quase. Desde Fevereiro que a fenda na plataforma Larsen C parecia
ter abrandado a sua progressão no gelo, mas a 1 de Maio foi observada
uma mudança no cenário branco. Uma das pontas do risco no gelo
abriu-se em duas, apresentando agora uma bifurcação semelhante à
língua de uma cobra. O “novo ramo”, que nasceu dez quilómetros antes
do fim da fenda, surgiu mais perto do mar e dirige-se para a frente de
gelo, segundo os dados recolhidos pelo cientistas do Projecto Midas,
da Universidade de Swansea, no País de Gales (Reino Unido) que
acompanham a evolução da plataforma Larsen C. O ramo que actualmente
terá cerca de dez quilómetros de comprimento não aumenta o tamanho da
fenda original, mas deverá aumentar a fragilidade do bloco do gelo
formando uma ponta com duas brechas.

Em Janeiro, quando só havia uma fenda, o rasgo no gelo já tinha cerca
de 175 quilómetros, faltavam 20 para se partir. Agora, com o tal
abrandamento registado desde Fevereiro, as duas pontas quase paralelas
da fenda chegam aos 180 quilómetros. Segundo os investigadores, a
abertura deste novo ramo terá surgido quando a fissura original
atingiu gelo mais macio e por isso mais difícil de se fracturar,
transferindo a pressão e tensão para outra zona do bloco.

Segundo uma publicação dos investigadores no site do Projecto Midas, a
observação directa do novo ramo da fenda é difícil por causa do
Inverno que está actualmente instalado na Antárctida. Assim, explicam
na nota, as observações foram apoiadas nas imagens de interferometria
recolhidas pelos satélites Sentinela, da Agência Espacial Europeia.
“Embora o comprimento da fenda tenha ficado estável durante vários
meses, tem crescido de forma constante, a taxas superiores a um metro
por dia. Este alargamento tem aumentado sensivelmente desde o
desenvolvimento do novo ramo, como pode ser visto nas medições da
velocidade do fluxo de gelo”, referem os cientistas.

E agora?

Quando este bloco de gelo se separar, a plataforma Larsen C perderá
mais de 10% da sua área, fazendo com que a frente de gelo fique na
posição mais recuada de sempre. “Este fenómeno vai mudar de forma
fundamental a paisagem da Península Antárctica”, dizem os
investigadores dedicados ao Projecto Midas, lembrando que a “nova
configuração será menos estável”. Por outro lado, referem que é
possível que a Larsen C siga o exemplo da sua vizinha (Larsen B), que
se desintegrou em 2002, após um fenómeno semelhante ao que está agora
a acontecer.

Gigantesco icebergue prestes a nascer na Antárctida

As lições aprendidas com a desintegração da Larsen A e a Larsen B, em
1995 e 2002, mostram também que a entrada no oceano destes grandes
blocos de gelo, que são a parte final dos glaciares, aumenta o nível
do mar.

Ao Inverno que alonga as noites na Antárctida e dificulta as
observações e ao gelo macio, soma-se outro factor que pode acelerar o
inevitável desfecho da separação do icebergue. O centro de
investigação British Antarctic Survey publicou na semana passada um
estudo que mostra que naquela zona sopra actualmente um especial vento
quente (foehn) que cai sobre as montanhas da península para a
plataforma de gelo Larsen C e que pode ajudar a derrete-la. Se um dia
ocorrer o colapso da Larsen C (e para confirmar se isto acontece ainda
será preciso esperar muito tempo), não será um caso inédito.

A lista de plataformas de gelo que se partiram, recuaram ou perderam
volume nas últimas décadas é longa. Faz parte do ciclo de vida dos
glaciares. Uma das explicações para este tipo de fenómenos está
centrada nas alterações climáticas. E a Península Antárctica é dos
locais que têm estado a aquecer mais depressa no planeta: desde 1950,
a temperatura média anual do ar subiu cerca de três graus Celsius.
Porém, esta separação do icebergue da plataforma flutuante de gelo
poderá ter também causas naturais, uma vez que os colapsos destas
placas são frequentemente o resultado de questões dinâmicas. O mais
provável mesmo será estarmos a assistir ao resultado da força da
natureza, empurrada pela mão humana.

Resta esperar. A cada seis dias, há um radar em satélites que envia
informação sobre a superfície de gelo para os investigadores.

Fonte: Jornal Publico



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