ARLA/CLUSTER: Depois de 2016, 900 mil lares portugueses vão ter de reorientar antenas e configurar boxes de TDT - Os operadores de telemóveis estão desesperados por frequências e o Estado precisa de receitas

João Costa > CT1FBF ct1fbf gmail.com
Sexta-Feira, 21 de Novembro de 2014 - 21:11:56 WET


TDT: Portugueses vão ter de mexer nas antenas de TV outra vez

Por Hugo Séneca in Exame Informatico


Mais de 900 mil lares portugueses vão ter de reorientar antenas e
configurar boxes de TDT. Anacom prevê alterações para depois de 2016 e
admite que a renovação dos retransmissores seja suportada pelo erário
público.

As transmissões de Televisão Digital Terrestre (TDT) vão mudar de
frequências – e com essa alteração, há uma grande probabilidade de os
lares e empresas terem de reorientar, de novo, antenas e configurar
boxes usadas para captar o sinal que transmite por via hertziana os
quatro canais generalistas. As mudanças só vão ocorrer no território
continental – mais de 900 mil lares deverão ser abrangidos por esta
mudança, que está prevista para depois de 2016.
Questionada pela Exame Informática, a Autoridade Nacional das
Comunicações (Anacom) nega que seja necessário substituir as antenas
de TDT, mas confirma que «é provável que as antenas tenham de ser
reorientadas». «Contudo tal dependerá de cada situação concreta e do
planeamento e da implementação da rede. Nas regiões autónomas tal não
será necessário», acrescenta a entidade que regula as comunicações.

Sobre a data da migração de frequências, a Anacom informa: «A
obrigatoriedade de libertação da faixa dos 694-790 MHz só ocorrerá na
decorrência de eventual decisão comunitária neste sentido, que não se
prevê que venha a ocorrer antes de 2016/2017», informa a Anacom, por
e-mail.
A reguladora das telecomunicações admite ainda como hipótese que as
frequências hoje usadas para a TDT não tenham de ser libertadas – mas
no mercado são muitas as vozes que garantem que esta posição é um mero
formalismo. Até porque a configuração da rede de TDT está longe de ter
sido um sucesso do ponto de vista técnico - e por variadas vezes houve
registo de queixas da população.
A própria Anacom, num relatório de uma consulta pública realizada em
2013, classifica a migração de frequências da TDT como «muito
provável».

Decisão de 2012
Em fevereiro de 2012, a a Conferência Mundial da Rádio (WRC), da
Organização Internacional das Telecomunicações (ITU), reuniu, como é
costume, em Genebra, Suíça. Entre as decisões tomadas pelo principal
organismo de referência no que toca à gestão de radiofrequências a
nível mundial, há uma que é decisiva para a reconfiguração de antenas
e boxes portuguesas num futuro próximo: a resolução 232 determina que,
na conferência agendada para 2015 deverá ser confirmada, com valor de
norma para a Europa e a África, a atribuição da faixa de frequências
dos 694 MHz aos 790 MHz para as redes de telemóveis do futuro.

Acontece que a TDT portuguesa opera no denominado Canal 56, que ocupa
as frequências entre os 750 MHz e os 758 MHz que, por sua vez, estão
quase “a meio” da faixa de frequências que a WRC determinou que
deveria passar a ser usada para as novas gerações de redes de
telemóveis. Resultado: para cumprir as decisões da WRC, a TDT
portuguesa vai ter de mudar de frequências.

Hoje, a TDT é transmitida em Portugal Continental através de um único
canal – e por isso se chama a esta configuração de rede Single
Frequency Network (SFN). A Anacom já deu a conhecer um novo mapa de
cobertura de TDT, que divide o país em 12 regiões, atribuindo a cada
uma destas regiões um canal específico.

Ao passar a usar várias frequências, a rede apresentada recentemente
pela Anacom envereda pelo conceito de Multiple Frequency Network
(MFN). Os canais da "nova" rede de TDT têm em comum o uso de
frequências “abaixo” da faixa entre 694 MHz e 790 MHz e, por isso, não
conflituam com a decisão da WRC.
Com a migração de uma rede SFN para uma rede MFN, a TDT abandona o
canal 56 que servia todo o país, e passa a usar os canais 33, 34, 40,
42, 43, 45, 46, 47, 48, 49 e 43, que operam em cada uma de 12 regiões
delineadas. Algumas das regiões usam o mesmo canal - mas não são
confinantes. O que evita as interferências registadas, nestes últimos
dois anos, com a configuração de SFN.

De acordo com vários especialistas ouvidos pela Exame Informática, a
rede MFN, além de usada na larga maioria dos países, tem a vantagem de
pôr termo aos problemas de sintonização que afetaram centenas de
milhares de lares em Portugal depois da migração para a TDT, em 2012.
Nuno Borges Carvalho, professor da Universidade de Aveiro e
investigador do Instituto de Telecomunicações (IT), não tem dúvidas:
«Mais tarde ou mais cedo vai ser feita a migração de frequências para
MFN. Os operadores de telemóveis estão desesperados por frequências e
o Estado precisa de receitas. Faz sentido que (em vez de um único
canal como na SFN) se usem vários canais para transmitir a TDT, porque
se conseguiu provar que uma transmissão com SFN para um território com
esta dimensão não funciona».

Paulo Nunes, professor do ISCTE e igualmente investigador do IT,
recorda que a opção de fazer uma transmissão confinada a um único
canal, como ocorre com a configuração SFN, tem a vantagem de libertar
espetro que pode ser usado para as redes móveis, mas apresenta
limitações técnicas. «É possível fazer a cobertura de um país como o
nosso, mas se um retransmissor tiver uma propagação maior que aquela
que está prevista teoricamente, acaba por interferir com o sinal de
emissores que operam com o mesmo canal, mas noutras regiões. E nesse
caso são geradas interferências».
Paulo Nunes relaciona as queixas que surgiram depois da migração do
sinal de TV analógico para a TDT com o facto de o relevo geográfico e
também as condições climatéricas poderem aumentar a propagação das
ondas hertzianas. «Tipicamente, à noite, há maior propagação. Se um
emissor, nessa altura, consegue um alcance superior a 50 ou 60
quilómetros acaba por provocar interferências destrutivas (nas
emissões de outros retransmissores)», acrescenta o professor do ISCTE,
lembrando que «há problemas que só se detetam com a implementação» e
reiterando a convicção de que a Anacom terá tomado a decisão que, à
luz da informação disponível, considerou a mais indicada.

Os custos da migração de SFN para MFN podem ir além do trabalho
exigido pela reorientação de antenas e reconfiguração das boxes que
não conseguem captar o sinal automaticamente. «Há transmissores que
apenas operam em SFN e que têm de ser substituídos por outros que
operam em vários canais. Nos transmissores que já operam em vários
canais, terá de ser feita a necessária configuração», explica Nuno
Borges Carvalho, admitindo que seja necessário investir na rede para
poder migrar de SFN para MFN.

A Anacom não afasta a hipótese de a renovação da rede de
retransmissores de TDT ser suportada pelo erário público. A Portugal
Telecomunicações Comunicações (PTC), que presta o serviço em regime de
concessão, apenas deverá investir na renovação da rede de
retransmissores se se provar que o atual serviço de TDT não respeita
os parâmetros de qualidade. «A migração para a rede MFN poderá ser
abreviada, suportando a PTC os custos a que haja lugar, caso se
antecipe ou assim que se verifique que a rede em funcionamento não
apresenta a estabilidade necessária à oferta do serviço com os níveis
de qualidade constantes da Recomendação ITU - RBT.1735-1e suas
revisões futuras», refere a Anacom.



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