ARLA/CLUSTER: Voyager 1: Um transmissor de 23 watts a quase 19 mil milhões de quilómetros do Sol.

João Costa > CT1FBF ct1fbf gmail.com
Sexta-Feira, 13 de Setembro de 2013 - 13:17:02 WEST


Voyager 1 é o primeiro objecto feito por humanos a sair do sistema solar

Sonda espacial lançada em 1977 para estudar Júpiter e Saturno continuou
viagem até aos limites do sistema solar. Continua a comunicar com a Terra,
36 anos depois.

A quase 19 mil milhões de quilómetros do Sol, a Voyager 1 era há muito o
objecto construído por humanos que mais longe tinha chegado. Agora,
tornou-se oficialmente no primeiro a ultrapassar os limites do sistema
solar. A sonda espacial norte-americana, que continua a enviar dados para a
Terra, entrou no espaço interestelar.

A Voyager 1 foi lançada a 5 de Setembro de 1977 de Cabo Canaveral, Florida.
Uns dias antes, a 20 de Agosto, tinha sido a Voyager 2. A missão era
observar o sistema solar exterior. A primeira deveria sobrevoar Júpiter e
Saturno (o que fez em 1979 e em 1980). A segunda, além do grande gigante
gasoso do sistema solar e do planeta dos anéis, teria de sobrevoar Úrano
(1986) e Neptuno (1989). E seguir viagem.

Estão há mais de 36 anos no espaço e a expectativa era que a Voyager 1
ultrapassasse os limites do sistema solar em 2015. Nesta quinta-feira,
num artigo
publicado na revista
*Science*<http://www.sciencemag.org/content/early/2013/09/11/science.1241681.abstract>,
a equipa de cientistas da NASA que acompanha a missão revelou que a sonda
atravessou a heliopausa e chegou ao “abismo do espaço interestelar†a 25 de
Agosto de 2012.

“Não sei se isto está no mesmo campeonato que aterrar na Lua, mas está bem
lá em cima – material *Star Trek*, de certezaâ€, ilustra Donald A. Gurnett,
um dos autores do artigo, citado pelo *The New York Times*. “Quer dizer,
considere a distância [19 mil milhões de quilómetros do Sol]. É difícil até
para os cientistas compreenderemâ€, sublinha o professor de Física da
Universidade do Iowa.

Aos 77 anos, Edward C. Stone é, para a NASA, o maior especialista em
missões Voyager. O cientista trabalha neste projecto desde 1972 e está a
viver o momento com entusiasmo. Mais do que isso, já anseia pela porta
aberta para novas descobertas. “Isto é histórico, um pouco como a primeira
exploração da Terraâ€, afirma, citado pelo mesmo diário norte-americano.

O último ano foi de intenso debate. Os cientistas da NASA tiveram de
avaliar os dados enviados pela Voyager 1 com “muito, muito cuidado†– diz
Stone – até os líderes da missão chegarem a um consenso sobre se a sonda
teria atingido o espaço interestelar. Acabaram por concordar que de facto
tinha acontecido, mais cedo do que o esperado.

As derradeiras provas chegaram entre Abril e Maio, quando se receberam na
Terra as gravações sonoras das vibrações captadas pela antena de ondas
plasma da sonda <http://youtu.be/LIAZWb9_si4>. Calculada a densidade do
plasma à volta da nave, acabaram-se as incertezas. “Era exactamente o que
esperávamos de plasma interestelarâ€, diz Gurnett. Depois, compararam os
dados com os do Verão de 2012.

*Rock n’ roll para extraterrestres*
Os recursos de que a Voyager 1 dispõe para recolher informação são
obsoletos e a própria NASA tem dificuldade em encontrar quem, a partir da
Terra, consiga tirar o melhor partido possível do material disponível. A
bordo existe um gravador de oito pistas e computadores com tão pouca
memória que um nativo digital não saberia como dar-lhe uso.

Mas a sonda também leva alguns objectos intemporais. É o caso da *Quinta
Sinfonia* de Beethoven ou de *Johnny B. Goode*, de Chuck Berry. Ou os sons
de trovões, vulcões e terramotos, de hienas e elefantes, do vento, da
chuva, do riso.

Para esta missão, a NASA decidiu ser mais ambiciosa nas mensagens que
enviava para o Espaço, na eventualidade de as sondas se cruzarem no futuro
com vida inteligente extraterrestre. Até ali, as naves levavam uma placa
com o local e o ano de origem. Em 1977, as Voyager levavam uma parafernália
de imagens, sons, música e mensagens em 55
línguas<http://voyager.jpl.nasa.gov/spacecraft/goldenrec.html>–
incluindo do Presidente norte-americano Jimmy Carter e do então
secretário-geral da ONU, o austríaco Kurt Waldheim. A selecção foi feita
por um comité encabeçado por Carl Sagan.

Se alguma vez os discos analógicos (que estão munidos de instruções, por
símbolos) chegarem a ser tocados, a 16-2/3 rotações por minuto, nunca o
saberemos. Pelo menos pelos nossos próprios meios. Isto porque a Voyager 1
deve perder a capacidade para enviar informação para o Jet Propulsion
Laboratory por volta de 2025 e a sonda só deve cruzar-se com um planeta
dentro de 40 mil anos. Mais ou menos. Aliás, a sonda ainda consegue enviar
dados – que demoram 17 horas a chegar à Terra, devido à distância – por
estar a poupar energia desde 1990.

Nesse ano, tirou a sua última fotografia: um retrato de família do sistema
solar. Foi o fim de uma carreira que deu aos seres humanos imagens nunca
vistas de Júpiter e de Saturno. Há dias, o University College de
Londres disponibilizou
em alta resolução <http://www.publico.pt/n1604911> um mosaico de
fotografias das luas de Júpiter. Outras imagens captadas pela Voyager 1
podem ser vistas no *site* que a NASA dedica à
missão<http://voyager.jpl.nasa.gov/>
.

Uma década antes de se acabarem as fotografias, em 1980, já o instrumento
de medição da energia nas partículas de plasma tinha deixado de funcionar.
Resta o sensor que permitiu concluir o histórico acontecimento que os
cientistas agora festejam. Quando uma erupção solar voltar a agitar a
antena, a Voyager 1 voltará a enviar uma mensagem para a Terra, através do
seu transmissor de 23 watts.

Fonte: Por Hugo Torres <http://www.publico.pt/autor/hugo-torres> no Jornal
Publico
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