ARLA/CLUSTER: DSTAR, queixinhas e outras choraminguices

Radiophilo radiophilo gmail.com
Sexta-Feira, 9 de Julho de 2010 - 19:26:55 WEST


Caros colegas,

Embora isso quase não venha ao caso, começo por dizer que eu pessoalmente
não sou adepto do DSTAR.

Este avançado modo de comunicação é alvo de fortes críticas, quer por parte
de alguns radioamadores, quer de autoridades radioeléctricas nacionais.
Neste último caso, foram aqui recentemente trazidos dois casos que merecem
consideração, nomeadamente da França e da Nova Zelândia.

O caso francês, por resumir razoavelmente o conjunto das queixas normalmente
apresentadas  merece ser analisado em todas as vertentes:

Ao contrário do que se reclama nos artigos apresentados, a ARCEP não proibiu
o uso do DSTAR em frança. Na verdade a legislação francesa especifica quais
os modos autorizados para cada classe de amador, e em nenhum deles consta o
F7W. Ou seja, por definição, nenhum novo modo está autorizado, sendo
necessário que a autoridade aprove o seu uso, caso a caso. Em Portugal isto
não é assim, sendo a nossa legislação um pouco mais progressista.

Neste contexto a  DR  F, uma associação francesa de amadores de
radiocomunicações digitais, solicitou à ARCEP uma autorização individual
para utilização do DSTAR a título experimental, o que foi concedido por um
prazo de 6 meses. Posteriormente, esta autorização foi alargada por mais 6
meses, para um conjunto maior de amadores. Finalmente, a DR  F solicitou a
alteração da legislação de forma a permitir o uso generalizado do DSTAR, sem
restrições. Este pedido foi recusado, e os motivos da recusa foram os
seguintes:

1. O artigo 5 da regulamentação francesa de amador diz que: "As instalações
radioeléctricas dos serviços de amador não devem ser interligadas a uma rede
aberta ao público, a uma rede independente ou a toda a instalação
radioeléctrica que não tenha o carácter de instalação de amador."
A ARCEP diz que, por um lado o DSTAR especifica um tipo de interconexão que
permite esse tipos de ligações, e por outro lado a utilização generalizada
do DSTAR impediria o controle do cumprimento dessa regra. Por estes motivos,
não considera apropriado alterar a lei para autorizar o DSTAR.
Esta objecção levanta-se evidentemente a vários outros modos ou tecnologias
usadas por amadores e não apenas ao DSTAR.

2. Ainda no quadro de certas disposições regulamentares, a ARCEP considera
que "o modo de emissão F7W associado ao DSTAR coloca riscos de segurança
pública na medida em que a informação difundida só pode ser descodificada
com recurso a software específico".
Admitindo que tenha entendido correctamente a objecção da ARCEP, parece-me
que este argumento se fundamenta em dois disparates.
O primeiro é que esta objecção se aplica a todo e qualquer modo digital, e
não apenas ao DSTAR. Embora isto seja reconhecido pela ARCEP ao levantar a
objecção ao F7W e não ao DSTAR, a verdade é que o software de qualquer modo
digital sendo "específico", não deixa de ser "público", caso contrário
ninguém comunicaria com ninguém. O outro disparate é pensar que a utilização
dos modos digitais pelos amadores colocam problemas de segurança pública,
quando outras comunicações digitais (GSM, UMTS. etc) são largamente
promovidas para utilização por um público bem maior, mais anónimo, e mais
difícil de controlar. Não parece fazer qualquer sentido.

3. A ARCEP reclama ainda que "O DSTAR utiliza um codec de voz patenteado e
proprietário. Desta forma, os amadores não têm acesso à especificação
detalhada deste codec sob a forma de circuito integrado, nem o direito de o
utilizar sem adquirir um produto sob licença." Segundo a ARCEP, isto está em
contradição com o artigo 1.56 do RR da UIT que diz que o serviço de amador é
"um serviço de radiocomunicação tendo por objectivo a instrução individual,
a intercomunicação e os estudos técnicos, efectuado por amadores, isto é
pessoas devidamente autorizadas, interessadas na técnica da
radioelectricidade a título unicamente pessoal e sem interesse pecuniário".
Esta ligação também me parece inteiramente descabida. Por um lado o
interesse pecuniário está do lado das empresas construtoras e não dos
radioamadores. Por outro lado, o DSTAR pode ser justamente o meio adequado
para o desenvolvimento de técnicas de voz digital realizado por amadores,
como alternativa ao tal Codec. Finalmente, também não é frequente os
amadores fabricarem os seus próprios componentes electrónicos.

Esta última questão, do Codec, tem sido o cavalo de batalha de muitas vozes
que se levantam contra o DSTAR, amplamente divulgadas por variadíssimos
foruns de amadores por esse mundo fora e também aqui neste Cluster
reproduzidas já várias vezes em 3ª ou 4ª mão.

O argumento típico é de que o AMBE é patenteado e custa dinheiro e é
produzido por uma empresa que está a enriquecer à custa dos radioamadores,
não lhes facultando o respectivo código. Além disso, segundo eles, este
estado de coisas é contra o "espírito" do radioamadorismo.

Pois bem, façamos contas. De um lado temos a JARL, a ICOM e a DVSI em
conluio contra os radioamadores, para lhes vender equipamentos que:

1. Lhes têm permitido experimentar amplamente no estabelecimento e
administração de redes de comunicação globais com alguma complexidade.
Embora isto não seja exactamente novidade, creio bem que nunca tanto como
hoje isto tem sido verdade. Temos inclusivé entre nós alguns especialistas
nesta área.

2. Possibilitam a experimentação a uma escala bem alargada do potencial e da
utilização das técnicas de voz digital, por comparação com a voz analógica.
Também aqui no Cluster já todos lemos informações úteis e interessantes
obtidas por via desta experimentação.

Além disto, o DSTAR possibilita aos radioamadores que queiram materializar o
tão advogado "espírito" do radioamadorismo:

3. Desenvolver e construir equipamentos sofisticados que são operáveis nas
actuais redes DSTAR, recorrendo para isso ao chip AMBE-2020. É barato e está
disponível. Custa menos que um transistor de 60W para VHF. Não há desculpas.

4. Desenvolver e construir equipamentos sofisticados que poderão ser
operáveis nas actuais redes de DSTAR, embora não compatíveis com outros
terminais que utilizem o AMBE. Quem quiser, é livre de desenvolver um codec
de voz ou adaptar outro já existente para utilização nas redes DSTAR.

Do outro lado temos os "velhos do Restelo" que dizem que o DSTAR não presta,
mas que em nada contribuiram, nem deles nada de jeito se espera, para o
progresso das comunicações de voz digital entre os amadores.

Se há algum balanço que se possa fazer em termos de progresso real e do seu
impacto no "espírito" do raidoamadorismo, então eu parece-me que o DSTAR
leva larga vantagem sobre os seus oponentes.

Finalmente deixo o desafio: se os oponentes do DSTAR quiserem realmente
viver o "espírito" do radioamadorismo, então deixem de falar e FAÇAM alguma
coisa, como os outros fizeram. Talvez aí deixem de ser considerados
diletantes e alguém lhes dê atenção.

Cumprimentos,
António Vilela
CT1JHQ
-------------- próxima parte ----------
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