<div dir="ltr">Nova Iorque. 3 de abril de 1973. Na sexta avenida dois homens conversam. Um tem um aparelho de plástico na mão. É um telemóvel, explica. Depois faz o primeiro telefonema de sempre. Para o inimigo.<br><br>Rui Tukayana in TSF<div><br><img src="cid:ii_15f15a93802f3cad" alt="Imagem intercalada 1" width="708" height="414" style="margin-right: 0px;"><br>Martin Cooper tem agora 88 anos. Sorri muito. Conta piadas. O cabelo é totalmente branco. O corpo já se curva um pouco mais do que ele gostaria, mas a memória está na mesma.<br><br><br></div><div>&quot;Claro que lembro. Nunca o irei esquecer.&quot; Marty lembra-se de tudo. &quot;Foi um momento muito importante na minha vida&quot;.<br><br>O jornalista Rui Tukayana falou com Martin Cooper, considerado o &quot;pai dos telemóveis&quot;<br><br><br>O inventor do telemóvel trabalhava para a Motorola. A empresa queria retirar à AT&amp;T o monopólio das telecomunicações nos Estados Unidos. Para tal só havia uma solução Inventar algo que ainda não existia. Demoraram três meses a criar o primeiro protótipo funcional do telemóvel. &quot; Depois fomos para Nova Iorque para chamar a atenção de pessoas como vocês&quot;, jornalistas bem entendidos.<br><br>Estava tudo programado para correr bem, mas &quot;na manhã do dia 3 de abril de 1973 (veja como eu me lembro dos detalhes) eu deveria ter estado num programa de TV. Mas bem, você sabe como são os jornalistas... Acabei por ser trocado por alguma coisa mais importante, e acabei por conversar com um jornalista de rádio como você&quot;.<br><br>E lá vão eles os dois, sexta avenida abaixo, a conversar. &quot;Então, enquanto caminhávamos, liguei para o meu rival na AT&amp;T, um tipo chamado Joel Engle, e surpreendentemente ele atendeu o telefone&quot;.<br><br>Não foi um dia bom para aparecer no escritório terá pensado Engle.<br><br>&quot;Eu disse, Joel, daqui fala o Marty Cooper. Ele respondeu &#39;olá, Marty&#39;. E eu disse-lhe que estava a ligar-lhe de um telefone celular (é o que nós lhes chamamos nos EUA), mas um telefone celular a sério, um telefone pessoal, móvel, portátil, celular&quot;.<br><br>Do outro lado só havia silêncio.<br><br>Ainda hoje, Joel Engel prefere fazer de conta que não se lembra do telefonema. &quot;Alegadamente, isso mesmo&quot;. Marty ri-se e diz que achou o telefonema muito divertido, &quot;mas o Joel nem tanto. Acho que ele não gosta de mim&quot;.<br><br>Quanto ao impacto da sua invenção, o antigo engenheiro da Motorola diz que mesmo há quarenta anos era fácil perceber que estava prestes a mudar tudo. Na altura, o que havia eram rádios de duas vias, &quot;e descobrimos que, assim que as pessoas tinham esse dispositivo, não podiam viver sem ele&quot;. Mais: &quot;fizemos um estojo para os usar à cintura, mas ninguém os usava assim. Eles faziam o que você faz, andavam com aquilo na mão. Assim, nós já tínhamos a certeza que os telemóveis iam tornar-se parte das pessoas&quot;.<br><br>O humor de Marty já vem de trás. &quot;Eu tinha uma piada que contava quando as pessoas me faziam essa pergunta em 1973: eu dizia que, um dia, quando uma pessoa nascer, vai receber um número de telefone. E quando não atender nesse número é porque morreu&quot;.<br><br>Demorou dez anos até que os telemóveis passassem dos protótipos às vendas. Agora, passados mais de 40 anos sobre o primeiro telefonema, Martin Cooper considera que já chegamos ao pico dos telemóveis. &quot;Quantos pixels mais um ecrã poderá ter? Quantos megabits por segundo? Quão pequeno podemos fazer um telefone? Agora eles até estão a fazê-los grandes novamente&quot;.<br><br>Para satisfazer a curiosidade dos jornalistas, Martin Cooper tira do bolso o telemóvel. Está novinho em folha. É um Samsung Galaxy S8. Explica que tem &quot;sempre de ter os modelos mais recentes&quot;. Compreende-se. Fez o primeiro de todos. Os jornalistas perguntam se o facto de ter um telemóvel com Android, se isso quer dizer que é um melhor sistema operativo do que o iOS. Sem querer pôr fim a uma batalha antiga entre o sistema operativo da Google e o da Apple, Marty responde simplesmente &quot;eu não disse isso&quot;.<br><br>Depois olha para o seu telemóvel e volta a pensar no futuro: &quot;faz algum sentido, se quiser comunicar, ter de levantar o braço e ficar numa posição desconfortável? Um telefone com um ecrã plano contra as curvas da cabeça? Isso não é ergonómico. Isso não é confortável&quot;.<br><br>O que aí vem é muito diferente, mesmo, daquilo que temos agora.<br><br>&quot;Talvez tenha a forma de um brinco. E mais cedo ou mais tarde será implantado perto da sua orelha. Vai incluir um computador superpoderoso...&quot; e voltam as piadas. &quot;Quando eu quiser conversar com alguém, digo... qual é seu nome novamente? Ah! Rui! Não podia ter um nome mais fácil? Bem, vou dizer que quero falar com o Rui e o meu telemóvel vai responder &quot;o quê!??!?&quot; Mas, se ele entender o nome, o computador vai fazer a chamada e eu falarei consigo e sem ter de mexer os braços. E algum dia no futuro só teremos que pensar sobre isso. Não vou nem dizer as palavras. Esse, para mim, é o telefone ideal&quot;.<br><br>Martin Cooper, o pai do telemóvel, está em Portugal para participar na Techdays, uma conferência sobre tecnologia e mobilidade que começou quinta-feira e vai até domingo, em Aveiro.</div></div>