ARLA/CLUSTER: Portugueses resistem ao avanço dos audiolivros e a Amazon elege o "brasileiro" como a variante oficial do português

João Costa > CT1FBF ct1fbf gmail.com
Quinta-Feira, 13 de Fevereiro de 2020 - 12:47:18 WET


Crescimento internacional contrasta com reserva nacional. Elevado
investimento retrai aposta forte das editoras.

Da Inglaterra ao Brasil, de Espanha aos Estados Unidos da América, os
audiolivros estão a conquistar milhões de pessoas. Um fenómeno que,
apesar de indissociável do mundo digital, tem também um forte
simbolismo ancestral, ao resgatar a figura do contador de histórias.

Depois do malogro que foram os e-books, cujas perspetivas de
crescimento nunca se concretizaram, esta é a melhor notícia do mercado
editorial em muitos anos. Até porque, ao contrário do que acontecia
com os livros eletrónicos, os públicos são distintos. A faixa etária
que consome mais estes produtos, dos 18 aos 35 anos, está longe de ser
ativa na compra de livros.

Segundo dados da consultora Deloitte, o segmento dos audiolivros
deverá ultrapassar os três biliões de euros no final de 2020,
registando um aumentando de 25% em apenas um ano. A mesma consultora
estima que este nicho venha a representar a curto prazo 10% a 15% do
volume total de negócios do meio editorial.

E em Portugal? O cenário é tão distinto que basta dizer que, segundo o
Observatório Português das Atividades Culturais, o último - e único -
estudo feito sobre o tema remonta a... 2007.

História de fracassos

É "uma longa sucessão de inêxitos", como afirma Rui Beja - autor do
livro "Democracia do livro em Portugal" - a história dos audiolivros
em Portugal.

No final da década de 80, a Dom Quixote lançou uma coleção de
clássicos em audiocassetes sem grande recetividade. Mas foi na
primeira década do século que os esforços se fizeram sentir, com
editoras especializadas. Dessas, só a Boca ainda sobrevive,
dedicando-se a projetos mais autorais que podem ser adquiridos no seu
site e sem presença nos maiores espaços de venda.

Foi nesses anos que as editoras de autores como José Rodrigues dos
Santos ou Margarida Rebelo Pinto avançaram. Com resultados tão
modestos que ainda hoje, passada década e meia, o meio editorial reage
com cautelas a um investimento forte. Na plataforma Wook estão
disponíveis poucas dezenas de títulos, ínfima percentagem da oferta
que existe na generalidade dos países europeus.

Na Porto Editora, Paulo Rebelo Gonçalves frisa que "estão atentos".
Mas sublinha que esse "boom" só ocorreu em países "com excelentes
índices de leitura" e "dimensão de mercado". O que não acontece em
Portugal. "Nos próximos anos, será muito difícil rentabilizar qualquer
investimento nessa área", vaticina.

Ainda mais lacónica é a Leya que, através de José Menezes, fez saber
que "o formato tem vindo a ser discutido", mas que a implementação
"requer ainda debate e estudo".

Estas posições não surpreendem Paulo Ferreira, CEO da Bookcompany,
para quem "a relação entre a baixa procura e os custos de produção"
mina qualquer esforço editorial. Como se não bastassem os custos
elevados de produção (cinco mil euros, segundo Rui Beja) e o preço
final alto do produto, "o audiolivro interessa mais ao leitor que
conhece a oferta internacional e não espera pelas versões
portuguesas".

Se, por cá, impera a expectativa - embora Paulo Ferreira afirme não
acreditar que o meio "alguma vez se venha a afirmar" -, a nível
internacional o momento é de grande dinamismo. E as notícias não são
animadoras, porque empresas como a Amazon elegeram o "brasileiro" como
a variante oficial do português, o que significa que o leitor nacional
que subscreva um serviço destes se arrisca a ouvir "Férrnando Pêssoa"
(praticamente o único autor português representado) como jamais
imaginara.

Fonte: Jornal de Noticias



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