ARLA/CLUSTER: Uma tempestade solar em 1967 colocou o mundo à beira de um conflito militar

João Costa > CT1FBF ct1fbf gmail.com
Terça-Feira, 4 de Outubro de 2016 - 13:52:01 WEST


Por Sérgio Paulino <http://www.astropt.org/author/spaulino/>

[image: tempestade_solar_1967_nso-h-alfa]
<http://www.astropt.org/2016/09/25/tempestade-solar-de-1967-colocou-o-mundo-a-beira-de-um-conflito-militar/tempestade_solar_1967_nso-h-alfa/>O
Sol a 23 de maio de 1967. A região brilhante visível acima do centro do
disco solar corresponde ao local onde ocorreu a intensa fulguração solar.
Crédito: Arquivo Histórico do National Solar Observatory.


A 23 de maio de 1967, o mundo esteve à beira de um conflito militar de
proporções desastrosas. No meio da enorme tensão política e económica que
se instalou após a Crise dos Mísseis de Cuba, uma das maiores tempestades
solares do século XX provocou subitamente o bloqueio quase simultâneo das
comunicações de rádio no hemisfério diurno do planeta e dos três radares
norte-americanos responsáveis pela vigilância militar das regiões polares.
Localizados no Alasca, na Gronelândia e no Reino Unido, os radares tinham
sido concebidos para detetar mísseis balísticos provenientes da União
Soviética, pelo que a sua incapacitação foi interpretada como um ato de
guerra.

Contando com um ataque eminente, a Força Aérea americana autorizou de
imediato a descolagem de aviões munidos de mísseis nucleares para
enfrentarem a potencial ameaça soviética. Felizmente, funcionários dos
serviços militares de meteorologia espacial informaram a tempo o comando de
Defesa Aérea dos Estados Unidos (o NORAD) acerca dos possíveis efeitos
nefastos da tempestade solar nas comunicações de rádio e nos sistemas de
radar. A ação militar foi cancelada, evitando assim um potencial conflito
nuclear entre as duas maiores potências globais da época.

Em colaboração com um grupo de oficiais reformados da Força Aérea dos
Estados Unidos envolvidos na previsão e no estudo desta tempestade solar, a
investigadora Delores Knipp, da Universidade do Colorado, nos Estados
Unidos, trouxe recentemente a público este incrível pedaço da história da
Guerra Fria, num artigo
<http://onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1002/2016SW001423/abstract> publicado
na revista *Space Weather*. O impacto potencial desta tempestade na
história do século XX era até agora praticamente desconhecido, e é um
exemplo clássico de como as geociências e a investigação espacial têm um
papel fundamental na segurança nacional dos Estados Unidos.

“Se não fosse o facto de termos investido muito cedo na observação e
previsão de tempestades solares e geomagnéticas, o impacto [desta
tempestade] teria sido provavelmente muito superiorâ€, disse
<http://news.agu.org/press-release/1967-solar-storm-nearly-took-us-to-brink-of-war/>
Knipp.
“Esta foi uma lição aprendida no quão importante é estar preparados.â€

As forças militares americanas iniciaram a monitorização da atividade solar
e de distúrbios no campo magnético da Terra e na alta atmosfera terrestre
nos finais dos anos 1950. Na segunda metade dos anos 1960, um grupo do
Serviço de Meteorologia Aeronáutica da Força Aérea dos Estados Unidos (o
AWS) emitia já diariamente um boletim com informações acerca da ocorrência
de fulgurações na superfície do Sol. Capazes de libertar quantidades
imensas de energia numa vasta gama de radiações, as fulgurações solares
produzem com frequências intensas perturbações eletromagnéticas no nosso
planeta, que podem conduzir ao bloqueio temporário das comunicações de
rádio e das redes de distribuição de energia elétrica.

A 18 de maio de 1967, os funcionários do AWS observaram o aparecimento de
um enorme grupo de manchas solares, com intensos campos magnéticos, no
extremo leste do disco solar. A 23 de maio, o complexo mostrava-se ativo e
com possibilidades de produzir uma fulguração solar extremamente poderosa.
No mesmo dia, os observatórios do AWS no Novo México e no Colorado
observaram a olho nu uma gigantesca fulguração na superfície solar, pelas
19:40 (hora de Lisboa), ao mesmo tempo que o observatório radioastronómico
de Massachusetts divulgava a deteção de ondas de rádio com origem no Sol,
numa intensidade sem precedentes.

À medida que a tempestade se desenrolava na superfície do Sol, a Terra era
atingida por sucessivas vagas de partículas energéticas, provocando
interferências nas comunicações de rádio e o bloqueio dos três radares que
compunham a primeira linha do Sistema de Deteção Precoce de Mísseis
Balísticos. Desconhecendo que o incidente tinha sido provocado por uma
tempestade solar, oficiais das mais altas patentes do governo americano
deram ordem para a Força Aérea dos Estados Unidos colocar os seus caças
bombardeiros com ogivas nucleares em estado de alerta.

Nesse dia, encontrava-se em serviço no Centro de Previsão Solar do NORAD o
agora reformado coronel Arnold L. Snyder. Um dos funcionários do centro
informo-o que o comando central do NORAD queria saber se estava em
progresso algum fenómeno de atividade solar. “Recordo-me especificamente de
lhe responder com entusiasmo, ‘Sim, metade do Sol explodiu!’, e de depois
lhe relatar de forma mais calma e quantitativa os detalhes do eventoâ€,
explicou
<http://news.agu.org/press-release/1967-solar-storm-nearly-took-us-to-brink-of-war/>
Snyder.
Os dados recolhidos pelo AWS permitiram convencer o centro de comando do
NORAD que os três radares se encontravam no hemisfério diurno no momento da
fulguração, e que tinham sido incapacitados, não pelos soviéticos, mas por
ondas de rádio provenientes do Sol.

“Esta foi uma situação graveâ€, afirmou
<http://news.agu.org/press-release/1967-solar-storm-nearly-took-us-to-brink-of-war/>
Knipp.
“No entanto, foi aqui que a história deu uma volta: as coisas estavam a
correr terrivelmente mal, mas entretanto algo correu louvavelmente certo.â€
Os autores acreditam que foram as informações veiculadas pelo Centro de
Previsão Solar que impediram os altos comandos das forças militares
americanas de iniciar um ataque contra a União Soviética. Documentos
estudados por Knipp sugerem que estas informações alcançaram os níveis mais
elevados do governo dos Estados Unidos, incluindo possivelmente o
Presidente Lyndon Johnson.

A tempestade geomagnética que se iniciou cerca de 40 horas após a
fulguração solar, viria a provocar distúrbios de todas as formas
concebíveis nas comunicações de rádio nos Estados Unidos, durante
aproximadamente 1 semana, e atingiria uma intensidade suficientemente
elevada para produzir auroras em regiões tão a sul como o estado do Novo
México. Em última análise, o incidente levou as forças militares americanas
a reconhecer a importância dos serviços de monitorização da atividade solar
como uma ferramenta operacional em cenários de tensão militar, e conduziu à
construção de sistemas de previsão de meteorologia espacial mais robustos.

Podem consultar todos os detalhes deste trabalho aqui
<http://onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1002/2016SW001423/abstract>.


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