ARLA/CLUSTER: TDT em Portugal: Depressa e bem, não há ninguém!

João Gonçalves Costa joao.a.costa ctt.pt
Quinta-Feira, 8 de Julho de 2010 - 13:45:08 WEST


Anacom aprova plano de cessação das emissões analógicas terrestres.
 
A ANACOM aprovou, por deliberação de 24 de Junho de 2010, a decisão final sobre o plano detalhado de cessação das emissões analógicas terrestres (plano para o switch-off) associado à introdução da televisão digital terrestre (TDT) em Portugal. O plano, que esteve em consulta pública, foi aprovado com alterações mínimas em relação à proposta inicial. Deixo aqui os pontos que considero essenciais e as minhas considerações sobre o plano e os contributos da consulta pública.


Assim, as fases estão agora agendadas da seguinte forma:
1.ª Fase - 12 de Janeiro de 2012, para os emissores e retransmissores que asseguram sensivelmente a cobertura da faixa litoral do território continental;

2.ª Fase - 22 de Março de 2012, para os emissores e retransmissores que asseguram a cobertura das Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira;

3.ª Fase - 26 de Abril de 2012, para os emissores e retransmissores que asseguram sensivelmente a cobertura do restante território continental.

 A Anacom alerta (e bem) que os utilizadores abrangidos pelas 1.ª e 3.ª fases devem, em caso de dúvida, confirmar, se necessário com a ajuda de um técnico especializado, qual a estação analógica de onde recebem o sinal, em função do direccionamento da sua antena, com vista a certificarem-se da data em que o deixarão de o receber, de acordo com o plano de cessação das emissões analógicas. Eu diria melhor: em função do direccionamento da antena e dos canais (frequências) sintonizados.

Relativamente aos desligamentos em zonas piloto, estes continuam planeados para o 1º e 2º trimestre de 2011 e serão levados a cabo em retransmissores. A Anacom considera que os pilotos são acções exemplificativas e como tal o seu número não deverá exceder cinco. Este processo será objecto de deliberação específica e terá o envolvimento da PT Comunicações, dos operadores televisivos e da própria Anacom.

Quanto aos contributos no âmbito da consulta pública, a sua leitura revela-se particularmente interessante!

A primeira surpresa advém da ausência de qualquer contributo, quer por parte do operador público (RTP), quer por parte da Media Capital (TVI). Este aparente desinteresse talvez ajude a explicar em parte a actual situação da TDT portuguesa e, em particular, do problema chamado Canal HD. A PTC, operador das redes analógica e digital foi (naturalmente) a entidade que deu um maior contributo na consulta pública. SIC, ZON e Vodafone também participaram na consulta pública. 

A SIC, destaca que o switch-off implica antes de mais custos, em particular os relacionados com as campanhas de sensibilização do público e os associados à aquisição das set-top-boxes, considerando que o plano submetido a consulta não aborda tais matérias. Acrescenta que quaisquer campanhas de publicidade e sensibilização, nomeadamente a comunicação do fim das emissões analógicas e da data do switch-off, assim como qualquer outra publicidade à TDT, devem ser suportadas pelo ICP-ANACOM.

Defende só ser possível uma migração rápida por parte dos consumidores se as emissões forem em HDTV, sendo fundamental a introdução de uma compensação imediata dos operadores free-to-air, em particular a SIC, de modo a ressarcir o esforço de investimento necessário para uma transição atempada para o HDTV. Defende também a repartição das licenças de utilização de frequências entre os diversos operadores, a diminuição de tarifas de uso do espectro e condições preferenciais na atribuição de frequências para o DVB-H.

Do contributo da PTC destaco:
Diz estar preparada para o switch-off e considera as datas propostas viáveis;
Advoga ser mais adequado proceder ao switch-off num único momento ou no máximo em dois; 
Advoga também que os pilotos devem ser realizados em momento mais próximo das restantes datas de switch-off, sob pena de caírem no esquecimento. Sugere que estes sejam faseados no 2º trimestre de 2011;

Manifesta a sua preocupação com a alteração de frequências, no âmbito da harmonização europeia sobre utilização do espectro radioeléctrico na faixa dos 800MHz. Defende que as alterações a realizar nesta faixa devem ser promovidas o mais cedo possível. Argumenta que os custos decorrentes da alteração de frequências serão elevados, quer em termos de valores, quer em termos de tempos e chama a atenção para o efeito de retracção que a informação de uma nova alteração das instalações de recepção provocará nos utilizadores em matéria de adesão à TDT. Refere que do ponto de vista da rede TDT, o impacto desta mudança é significativo, e deverão implicar que zonas geográficas percam serviço durante um período significativo, que poderá atingir muitas horas ou até dias;

Refere as expectativas criadas em torno da TDT, designadamente no âmbito da introdução do 5º canal e das emissões em HD, relevando a importância que a concretização destas possibilidades teria no incentivo à migração voluntária para a plataforma digital; 
Refere ainda o impacto do preço, que considera elevado, das set-top-boxes que permitirão a migração e conclui que, no seu entender, não pode ser planeado e executado um plano de switch-off com as incertezas existentes relativamente ao planeamento da alteração da frequência associada ao Mux A, o preço das set-top-boxes, a indefinição associada ao 5º canal e a disponibilização de emissões com conteúdo em HD;

Entendimento da Anacom:
A respeito do preço das set-top-boxes, a Anacom diz «estar disponível nas lojas da especialidade e grandes superfícies, bem como para aquisição on-line, uma oferta já variada tanto de televisores como de set-top-boxes habilitados para a recepção de TDT em Portugal, a preços competitivos e tendencialmente decrescentes.»

A Anacom concorda ainda que a disponibilidade do 5º canal e de emissões em HD (em virtude da falta de entendimento, até à data, entre os operadores de televisão) seriam importantes para um maior incentivo à adesão, mas afirma que não é concebível protelar mais o planeamento do switch-off, e todas as demais acções necessárias à transição, em face dos prazos preconizados na UE para o efeito. 


Conclusão:
Como o caro leitor pode comprovar não há o nível de envolvimento necessário e desejável por parte de todos os envolvidos no processo. As televisões, a quem a TDT trará novas oportunidades de negócio e benefícios, deveriam ser os principais interessados em que o processo de transição analógico-digital decorra com a maior normalidade possível, infelizmente, pouco ou nada contribuem para o sucesso deste processo. 


Também julgo ser incompreensível que se aprove um plano para a cessação das emissões analógicas sem um conhecimento detalhado da situação actual. Falo naturalmente da ausência de dados publicados sobre o número de adesões à TDT, número de televisores compatíveis, preço médio das set-top-box, estimativa do número de instalações de antena incompatíveis, etc. Mas, não obstante a ausência de dados estatísticos, a TDT em Portugal foi já considerada um caso de sucesso por um membro do Governo!


Como venho repetidamente alertando desde a primeira hora neste Blog, o preço dos receptores é de facto um problema. Os preços teriam de ser acessíveis já e não só daqui a um ano! Agora, é o próprio operador da rede, que desvalorizou esse factor na apresentação da TDT, que o reconhece! O preço elevado vai inevitavelmente fazer com que muitos portugueses adiem para a última hora a adaptação das suas instalações de recepção, precisamente o contrário do que deveria suceder, ainda mais com um período de simulcast tão reduzido. 

Acresce ainda a notória ausência de equipamentos certificados para a TDT portuguesa, principalmente em matéria de receptores (set-top-box). A certificação dos equipamentos, recordo, constitui uma garantia do seu correcto funcionamento sob um conjunto alargado de situações e parâmetros de emissão, tanto hoje como no futuro. A utilização de equipamentos não certificados pode implicar custos futuros para o utilizador. 


Tal como a Anacom reconhece, Portugal vai ter um dos menores períodos de simulcast. Este período, em que as emissões digitais e analógicas coexistem, é fundamental para dar tempo, não só para os telespectadores prepararem as suas instalações para o sinal TDT, mas também para o operador de rede proceder a correcções na cobertura! Por muitas medições no terreno que sejam realizadas, só após uma adesão significativa da população serão detectados muitos problemas na recepção da televisão digital terrestre! E acreditem, em muitos locais do país vão existir problemas de cobertura que será necessário solucionar. Se não há ninguém a captar o sinal, os problemas, naturalmente, passam despercebidos.

Também, dado que a adesão à TDT ainda é marginal, é desejável (como a PTC defende), que a alteração das frequências seja feita o mais cedo possível, pois evitaria desta forma mais custos e constrangimentos para os telespectadores.

Depressa e bem, não há ninguém! A ver vamos, se também desta vez o ditado popular se irá cumprir!



Fonte: Blog Televisão Digital Terrestre (TDT) em Portugal.



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