ARLA/CLUSTER: Uma carta que define um Homem...

João Gonçalves Costa joao.a.costa ctt.pt
Quinta-Feira, 4 de Outubro de 2007 - 12:08:33 WEST


Prezados Colegas,

Depois de publicar o mail " CT1UX - Patrono dos Amadores de Rádio portugueses." um leitor desta nossa Lista, sugeriu que eu consulta-se um Blog; " A paixão dos sentidos" em: http://paixaodossentidos.blogspot.com/2007_03_01_archive.html e visse o que estava por lá.

Pois bem, meus Amigos, deixo-vos um EXCELENTE excerto onde a autora do Blog, Ana Ramon, descreve os seus encontro com o Carlos Mar Bettencourt Faria:

Mas, ao ver as fotografias e reler os recortes, lembrei-me do cientista Bettencourt Faria que tinha construído, quase só pelas próprias mãos um observatório astronómico em Mulemba-Angola, e que aceitou simpaticamente ser padrinho do nosso grupo.

[http://bp0.blogger.com/_HT5Rs3xYipI/RghaeRkB8tI/AAAAAAAAACA/YK21izx3LkM/s400/observatorio.jpg]<http://bp0.blogger.com/_HT5Rs3xYipI/RghaeRkB8tI/AAAAAAAAACA/YK21izx3LkM/s1600-h/observatorio.jpg>
<http://picasa.google.com/blogger/>

Eu escrevera-lhe para pedir informações e contactos que nos fossem úteis aqui em Portugal e a partir daí gerou-se uma grande amizade entre nós os dois. Ainda conservo algumas, apenas três, das suas cartas e um postal enviado da Polónia, que são um exemplo da simplicidade dos homens grandes.

Um homem que com o seu tempo todo preenchido por mil e uma actividades, ainda arranjava disponibilidade para escrever à máquina longas cartas e procurar cartazes com temas espaciais para enviar a uma miúda com 15 ou 16 anos que ainda andava no mundo a "apanhar bonés".

E sempre que passava por Portugal continental (na altura Angola ainda era uma colónia portuguesa) ia sempre visitar-me, conversar comigo e dar pequenos passeios a pé.

Lamentavelmente, a idade que eu tinha não era propícia ao reconhecimento do valor do homem que me escrevia e visitava

Também na minha casa, várias vezes tocou piano para mim, dedicando-me as suas composições, dizendo que aprendera a tocar sozinho e que nunca tivera uma aula de música.

Não consigo resistir a publicar aqui um excerto de uma das suas cartas:
"O que diferencia as pessoas não é ser bonito ou feio, não é ser rico ou pobre, não é ser católico ou protestante, inteligente de mais ou de menos.

É uma simples coisinha que muita gente não atina: a capacidade de determinação, de persistência, aquela espécie de febre que não desce no termómetro quando encontra pela frente as dificuldades inerentes e imediatas a quem se quer guindar a um muro muito alto.

Não faltará quem puxe as pernas, quem atire pedras, quem ponha cacos de vidro de garrafa das mais diversas origens no topo do muro. Mas sacudindo as pernas, cortando as mãos e os braços, suando pelo pescoço abaixo, que alegria é chegar ao outro lado, querida Ana!

 E não é o dinheiro, não são as glórias, nada, a não ser a incomensurável satisfação de ter chegado - onde os outros não chegaram - pelos seus próprios meios!

Toda a vida fui um solitário (ainda hoje o sou e muito mais penoso é à medida que os anos passam)

Nunca tive ninguém que me auxiliasse, e no entanto o que não tenho feito sozinho! É caso para envaidecer? Claro que não!

É caso para eu sentir, sempre sozinho, uma felicidade tão grande que até às vezes me dá vontade de chorar!"
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De pesquisa em pesquisa encontrei este link:
http://apaa.online.pt/bettencourt%20faria.pdf, cujo autor é o Luís Filipe Bettencourt Faria, seu neto, e que escreve assim:
Em 1976 o Centro Espacial da Mulemba, com um património de 200 mil contos e com uma reputação e actividades de âmbito internacionais invejáveis, entra numa fase difícil com o advento da Independência de Angola e com a consequente ordem de nacionalização desta instituição.

 Bettencourt Faria, então com 52 anos, passou algumas semanas numa tristeza profunda.

Acusado de espionagem e de ter um arsenal de armas em casa, sendo-lhe confiscadas até as potentes espingardas de ar comprimido de caça submarina, com a sua correspondência e telefone vigiados, a estação de rádio amador CR6 CH selada, pessoal estranho ao serviço a querer saber como tudo funcionava.

Foi na tarde de domingo de 4 de Julho de 1976, traiçoeiramente degolado ao baixar o vidro do carro, quando cumprimentava o "segurança" de serviço no portão principal das suas próprias instalações.
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Um anexo em HTML foi limpo...
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